domingo, 28 de junho de 2015

Casamento Gay - Dos EUA ao Brasil, Milhas de Celebrações


















Por Djair Junior



Eis que o azul do céu virtual amanheceu colorido. Não era o arco-íris resultante de gotículas de chuva e raios de sol, mas tratava-se de um arco-íris de celebração. O arco-íris não resultara das chuvas de Junho, mas de décadas de lutas e resistência de um povo que não quer nada além de direitos igualitários assegurados.
No dia 26 de Junho de 2015,  a Suprema Corte dos Estados Unidos da América (EUA) decidiu invalidar os vetos postos por alguns estados conservadores, legalizando assim, o casamento igualitário em todo o seu território. Esta medida tem grande importância, pois a ‘’autonomia’’ dos Estados americanos aliados ao conservadorismo, por muitos anos serviu como justificativa para que 14 dos 50 Estados não validassem este direito. (em 2004 o Estado de Massachusetts se tornou o primeiro do país a legalizar o casamento homossexual).
Aqui no Brasil desde 2011- através do reconhecimento do direito a União Estável para todos - os casais homossexuais puderam, por lei, usufruir dos mesmos direitos de um casal heterossexual. Apesar de se tratar de um conquista importante, este primeiro passo não foi o suficiente para garantir tal direito. Até o ano de 2013 foram documentados casos de juizes que se negavam a realizar estas uniões.
Como resposta a esta resistência, no dia 14 de maio de 2013, foi aprovada uma resolução que obriga todos os cartórios em território nacional a celebrar o casamento civil entre homossexuais, bem como realizar as conversões da união estável em casamento civil em todos os estados. Sim, caro leitor, o Brasil foi o 15° país no mundo e o 4°país americano a  reconhecer legalmente os direitos civis dos homossexuais.
Por  estratégia de marketing ou não, a tela da rede social mais utilizada pelos brasileiros - Facebook -  ofereceu a possibilidade de estampar nas fotos dos perfis dos usuários uma transparência com a bandeira do movimento LGBTT. O mesmo Brasil, que na rede social celebrou a conquista americana, ainda mostra-se resistente e ignorante ao asseguramento de alguns direitos humanos aos LGBTT’s.Listarei brevemente, algumas incoerências entre o que é garantido legalmente e o que é realizado na prática.
No site da Câmara dos Deputados, está sendo votada a aceitação ou negação da sociedade brasileira ao conceito de núcleo família presente no P.L do Estatuto da família. Com a pergunta: Você concorda com a definição de família como núcleo formado a partir da união entre homem e mulher, previsto no projeto de lei que cria o Estatuto da Família? Presenciamos de maneira explicita uma tentativa de retrocesso a uma não admissão de que existem uniões que não se enquadrem em um padrão heteronormativo. Ainda mais assustador é saber que até o momento em que escrevo este texto 4.383.021 pessoas, são coniventes com esse conceito reducionista.(Acessado em <http://www2.camara.leg.br/enquetes/resultadoEnquete/enquete/101CE64E-8EC3-436C-BB4A-457EBC94DF4E> em 29/06/2015).
Permitimos a união entre as pessoas do mesmo sexo, mas não ousem gritar um: ‘’Pode beijar o noivo!’’, pois somos líderes mundiais em crimes homofóbicos. No ano de 2014, foram registradas pelo Grupo Gay da Bahia 326 casos letais de homofobia. O conservadorismo e fundamentalismo arraigado em nosso pais e reforçado pela presença de um grande número de religiosos nos mais diversos casos políticos, não permite que avancemos para um modelo de sociedade de fato igualitária, onde todos tenham direito de ir e vir, de amar sem ser crucificado, de constituir famílias aos seus modos e de ter segurança e direito a vida.(  Acessado em : https://homofobiamata.wordpress.com/ em 29/06/2015).
Devemos celebrar o direito ao casamento gay nos Estados Unidos, como quem celebra uma conquista para o mundo. A lei garantirá que mais uma parcela da população mundial tenha direitos iguais no que se refere ao casamento e isso não se reduz a terras americanas, pois conquistas humanas são conquistas do mundo.  Que o Brasil e os Estados Unidos se aprimorem em garantias de direitos iguais e que sirvam de exemplo para outras nações. Que possamos somar as milhas de distâncias entre os Estados ás suas conquistas e convertamos em celebração ao amor. Só assim, veremos nos céus - virtuais ou reais - novos arco-íris, reflexos de tantas lutas.


segunda-feira, 1 de junho de 2015

ALGUMAS NOTAS SOBRE O FUTURO DO PRETÉRITO


















1. Futuro do Pretérito, tempo verbal que enuncia um fato que poderia ter ocorrido posteriormente a um determinado fato passado.
Freud nos diz que as histéricas sofrem de reminiscências. Talvez todos nós soframos de reminiscências. No relicário de nossa memória, de nossas lembranças, encontram-se representações periféricas que não possuem nome. São “aquilo” que nos acusa do que poderíamos ter sido e não se fez em nós. Um “a posteriori” sempre marcando presença na ausência do que não podemos ser, uma sombra de nós mesmos, o negativo de nossas possibilidades – sempre infinitas, sempre infinitas. O lastro de nosso umbigo.

2. Diz de um futuro em relação a outro, já ocorrido.
No filme “The Butterfly Effect”, de Eric Bress e J. Mackye Gruber (2004), Evan Treborn, um estudante universitário de vinte anos de idade, sofre os efeitos de um sistema dinâmico de dependência estreita entre as condições finais de sua história, em relação às iniciais.
H. G. Wells, já apresentara conteúdo ficcional semelhante em “The Time Machine” (1895), onde um cientista tenta consertar o passado, indo e vindo pelo tempo.
Interessante que em cada tentativa de modificação do que já foi, os personagens padecem de uma turbulenta experiência de transformação caótica daquilo que ainda será.
Interessante... No caso de “The Butterfly Effect”, os diretores nos oferecem alguns finais alternativos para o filme.

3. Hipótese, incerteza, irrealidade, o condicional do que não foi.
O que serei eu lá onde não se fez ainda, lá onde não me fiz ainda eu, olhando-me para o ontem do que fui e que creio ter-me predestinado a ser o que sou e o que serei? A isto posso chamar de Destino. Será possível vencer o Destino? Algumas pessoas parecem vencê-lo... Destino?
Serei eu fruto de combinações, de predisposições, de ambientes, de estruturas biológicas, de condenações metafísicas? Ou apenas serei?

4. Tempo verbal das possibilidades – se tratando de pensamentos, tudo é possível, “seria possível”.
O verbo “conjecturar” é deveras importante para a Psicanálise. Instrumento poderoso, desde que não confundido com devaneios estapafúrdios que conduzem-nos a abstrações sem sentido.
Em seu “Delírios e Sonhos na ‘Gradiva’ de Jensen” (1907), Freud permite-se conjecturar. O jovem Norbert, fascinado pelo relevo em mármore de sua Gradiva, (re)encontra a morta-viva nas ruínas de Pompéia. A fascinação se dá pelo efeito de ser o objeto de seu desejo – sua Gradiva em sua Pompéia -, nada mais do que Zoe, a amiga de infância, uma infância perdida no ontem, que direciona o agora, e traz o desfecho do amanhã. Zoe, por seu lado, aceita o destino de morta-viva imposto pela desatenção de seu pai e identificado no não correspondido amor de seu colega de infância. Ao final da obra de Wilhelm Jensen, de 1903, o amor, tratado por Freud como forma de cura, vence o delírio do jovem Norbert: o Desejo sobre o Destino.
Para além de uma aula de Psicanálise, um Freud genial entregando-se a uma grande conjectura sobre a infância remota e um futuro que, neste caso, acaba em “Happy End”.

5. Futuro do Pretérito, tempo da lógica do inconsciente. O Inconsciente, de certa maneira, é Futuro do Pretérito – inconscientes de tantas relações infinitamente possíveis.
O sujeito humano é sujeito inserido no cotidiano (ou quotidiano, de “status quo” – função de localização espacial). O cotidiano dos homens, correria à parte, é constituído de diálogos, conversas. As conversas entre pessoas são regidas por um tema assentado sobre uma lógica, normalmente oculta. Conversa-se, mas conversa-se sobre o que? Sobre várias coisas ao mesmo tempo – camadas de temas sobrepostos a outros temas. Ao núcleo oculto de um tema, encontramos regras próprias que o sustentam, regras estas também ocultas, inconscientes.
Atualmente, através do desenvolvimento das ideias psicanalíticas que, aliás, estão sempre a se desenvolver, percebemos a importância de relativizar o Inconsciente freudiano não mais como um “topos”, um lugar, mas sim como o próprio sistema de regras que regem o cotidiano, ou cotidianos dos homens. Não temos, então, o Inconsciente, mas sim inconscientes relativos aos diversos e possíveis campos de discurso.
Conversamos sempre sobre um “agora”, localizado entre um pretérito experimentado neste momento e um futuro desejante e projetado também neste momento.
Sou Eu agora, entre o que fui e o que serei.

MARCOS INHAUSER SORIANO é psicanalista, editor da Revista Vórtice de Psicanálise.