domingo, 25 de maio de 2014

CRÔNICA DE UM SACRAMENTO




















Por Marcos InHauser 


Vão vivendo assim, juntos, entre bofetões, mútuas humilhações, chutes e xingamentos, tudo temperado por noites de transa quente – o amor limita-se ao quarto.
Ele, esfuziante, faz o tipo “tutti buona gente”, amigo pronto para qualquer parada. Padece, entretanto, de uma maldição de que “tem de ser bonzinho”, numa crença em busca de seu Paraíso particular. Certa humildade germinou-se dentro dele, provavelmente enraizada na relação com a mãe “tutti buona gente”. A humildade o empurra para trás e para baixo – uma sola furada no sapato, seu troféu. Justifica-se exageradamente.
Ela, ditadura encarnada, acredita piamente possuir “o Pênis”. Mas não o possui... Projetou um mundo de soberba, chiquérrimo, “Very Important Person”. Fechada em tono de si mesma, em sua mesquinhez, é odiada pelas costas, um vazio relacional completo, provavelmente ligado ao Pai que não houve. Justifica-se empobrecidamente.
Casal mais que perfeito, quando visto pelo ângulo masoquista. E assim vão vivendo, aos berros, aos apelos nunca satisfeitos de completude, que existe apenas dentro do quarto.
Não há segredos lá, na individualidade que necessita ser preservada. Um estranho escancaramento de intimidade, ao extremo – experiência que não é pra qualquer um, somente para os fortes de alma.
Tiveram, juntos, criancinhas... Ele, para poder se projetar o pai/mãe perfeito. Ela, não se sabe ao certo.

Na Conferência XXXII das “Novas Conferências Introdutórias sobre Psicanálise”, de 1933, Freud, ao tratar da ansiedade e da vida instintual, apresenta resumidamente questões bastante relevantes sobre a relação entre o masoquismo, a necessidade instintual de punição e o supereu. Freud não deixa dúvidas quanto à cobrança punitiva do supereu, que germinando no inconsciente, vai assombrar o sujeito neurótico avassaladoramente, na direção de uma reparação sempre impossível.

Ele, satisfeitíssimo com a projeção de “um pobre coitado”, vai desenvolvendo uma hipocondria punitiva. A qualquer sinal de avanço em um ser maduro, sente a morte espreitar, observando-o à distância, esperando um momento de deslize... “Tutti buona gente”.
Ela, apaixonada eternamente pelo Pai que ama esbofeteando, cria uma soberba que, crescendo como tumor, vai isolando, diminuindo, aniquilando por completo a possibilidade de ser amada, posto não saber amar.

Freud já dizia que as coisas do Amor são melhor exploradas pelo poeta do que pelo analista. Cita-se, então, como preciso projeto de vida, Chico Buarque (1977/1978), ao final de “O Casamento dos Pequenos Burgueses”:

Ela esquenta a papa do neto
E ele quase que fez fortuna
Vão viver sob o mesmo teto
Até que a morte os una
Até que a morte os una


MARCOS INHAUSER SORIANO é psicanalista.

sábado, 10 de maio de 2014

MÃES MÁS


Um dia, quando meus filhos forem crescidos o suficiente para entender a lógica que motiva os pais e as mães, eu hei de dizer-lhes: Eu os amei o suficiente para ter perguntado aonde vão, com quem vão e a que horas regressarão.
Eu os amei o suficiente para não ter ficado em silêncio e fazer com que vocês soubessem que aquele novo amigo não era boa companhia.
Eu os amei o suficiente para fazê-los pagar as balas que tiraram do supermercado ou as revistas do jornaleiro, e fazê-los dizer ao dono: “Nós pegamos isto ontem e queríamos pagar”.
Eu os amei o suficiente para ter ficado em pé, junto de vocês, duas horas, enquanto limpavam o seu quarto; tarefa que eu teria feito em 15 minutos.
Eu os amei o suficiente para deixá-los assumir a responsabilidade das suas ações, mesmo quando as penalidades eram tão duras que me partiam o coração.
Mais do que tudo, eu os amei o suficiente para dizer-lhes “não”, quando eu sabia que vocês poderiam me odiar por isso (e em certos momentos, até odiaram).
Essas eram as mais difíceis batalhas de todas. Estou contente, venci! Porque, no final, vocês venceram também! E qualquer dia, quando meus netos forem crescidos o suficiente para entender a lógica que motiva os pais e as mães, quando eles lhes perguntarem se sua mãe era má, meus filhos vão lhes dizer:
Sim, nossa mãe era má. Era a mãe mais má do mundo…
As outras crianças comiam doces no café, mas nós tínhamos que comer cereais, ovos e torradas.
As outras crianças bebiam refrigerante, comiam batatas fritas e tomavam sorvete no almoço, mas nós tínhamos que comer arroz, feijão, carne, legumes e frutas. E ela nos obrigava a jantar à mesa, bem diferente das outras mães que deixavam seus filhos comerem vendo televisão.
Ela insistia em saber onde estávamos a toda hora (ligava para o nosso celular de madrugada) e “fuçava” nossos e-mails. Era quase uma prisão!
Mamãe tinha de saber quem eram nossos amigos e o que nós fazíamos com eles. Insistia que lhe disséssemos com quem íamos sair, mesmo que demorássemos apenas uma hora ou menos.
Nós tínhamos vergonha de admitir, mas ela “violava as leis do trabalho infantil”, pois tínhamos que tirar a louça da mesa, arrumar nossas bagunças, esvaziar o lixo e fazer todos esses trabalhos que achávamos cruéis. Eu acho que ela nem dormia à noite, pensando em coisas para nos mandar fazer no outro dia.
Ela insistia sempre conosco para que lhe disséssemos sempre a verdade e apenas a verdade. E quando éramos adolescentes, ela conseguia até ler os nossos pensamentos.
A nossa vida era mesmo chata. Ela não deixava os nossos amigos tocarem a buzina para que saíssemos; tinham que subir, bater à porta, para ela os conhecer. E, enquanto todos podiam voltar tarde, à noite, tendo apenas 12 anos, tivemos de esperar até os 16 para chegar um pouco mais tarde, e aquela chata ainda se levantava para saber se a festa foi boa (só para ver como estávamos ao voltar).
Por causa de nossa mãe, nós perdemos imensas experiências na adolescência: nenhum de nós esteve envolvido com drogas, em roubo, em atos de vandalismo, em violação de propriedade, nem fomos presos por nenhum crime. FOI TUDO POR CAUSA DELA!
Agora, que já somos adultos, honestos e educados, estamos a fazer o nosso melhor para sermos “pais maus”, como minha mãe foi.
Eu acho que este é um dos males do mundo de hoje: omissão. Falta de amor!

FONTE: http://formacao.cancaonova.com/familia/maes-mas/

quinta-feira, 1 de maio de 2014

EM TEMPOS DE BANANAS, DEMOS "BANANA" PARA O PRECONCEITO!


Por Walmilson Barros


A questão levantada essa semana foi muito pertinente em tempos onde associações desventuradas levam ao questionamento se estamos fazendo a coisa certa. A tal # (Hashtag) da semana seria #somostososmacacos ou #somostodoscontraopreconceito.....#nãoaoracismo, coisas do gênero. É de surpreender que até renomados autores como Emir Sader  terem entrado na “onda” de Neymar.

Essa associação negro/macaco não é de hoje, historicamente sabe-se que a linhagem é bem próxima dos hominídeos com os primatas não humanos, o projeto genoma está aí para não  deixar dúvidas apontando a bagatela de em torno de 90% de parentesco biológico e fenotípico também, isso é incontestável cientificamente. A questão ao meu ver é: por que o tal torcedor europeu se acha menos “macaco” que o sul-americano brasileiro representado na figura de Daniel Alves? Ainda estamos na égide do IMPERIALISMO? Da diferenciação cognitiva de “raças” onde um é civilizado e o outro é “bárbaro”? Ao que nos parece essa ideia está longe de acabar. Será que este torcedor europeu sabe dessas informações? Questiono mais: racismo deve ser associado a falta de informação?



São muitos os questionamentos, mas uma coisa é bem clara: devemos urgentemente buscar nossas raízes históricas para nos apegarmos àqueles que lutaram pelo fim do racismo, a intolerância em suas diversas nuances, não posso crer que em pleno século XXI a banana me sirva como  símbolo de luta, não a #banananãomerepresenta. Assim fazendo, apenas estamos acentuando algo já arraigado. Diante tantas opiniões que foram trazidas à tona nessa semana de bananada a que foi mais direta ao assunto foi a  Douglas Belchior, o autor do artigo foi curto e grosso: ao comer a banana Daniel Alves estava dando uma “banana” ao preconceito por ela o atingir indiretamente, sendo ele um jogador bem sucedido financeiramente? O ato de comer foi impulsivo ao momento vivido? Como resposta o jogador falou para rirmos do possível retardado, ponho uma hipótese para ser camarada com este torcedor europeu. Mas, como bem questionou Belchior o racismo de fato existiu, mas ele é social e de classe, logo um jogador das condições atuais como Daniel Alves não teria as mesmas preocupações e enfrentamentos dos Josés e Joões dos subúrbios brasileiros ao se defrontarem com o racismo.


Dentre tantas ideias e opiniões e aproveitamentos da situação, leia-se políticos de plantão, a questão deve ser levada a sério do sistema universitário a conversa de bar, até por que no Brasil se escolhe ser negro ou não por questões fenotípicas e a cada minuto sofremos com todo tipo de racismo, não só nós mas os negros do mundo como um todo, ou paramos para pontuar essa questão ou essa será apenas mais um episódio dentre tantos que o sucederam.

"...a questão deve ser levada a sério do sistema universitário a conversa de bar..."