domingo, 6 de setembro de 2015

Texto 1: A Chegada ao Plantão Psicológico

Por Luan Lins

Acredito que o sonho de grande parte do estudantes de psicologia é chegar ao momento da prática e colocar em ação, tudo aquilo que foi estudado durante madrugadas e fins de semana a fio, onde se é abdicado das festas, viagens, passeios e outros aparatos sociais aos quais temos que suspender em prol da nossa formação. Comigo não é diferente. Atualmente estou no oitavo período do curso de Psicologia, e na instituição onde estudo, iniciamos a prática curricular no oitavo período. Esta prática é a do Plantão Psicológico. O plantão não é uma modalidade usual e padrão para todos os cursos, porém, deixarei nas referências, artigos que falam um pouco sobre esta modalidade. De forma pontual, Tassinari define o plantão psicológico da seguinte forma:

“Em uma primeira aproximação pode-se definir o Plantão Psicológico como um tipo de atendimento psicológico, que se completa em si mesmo, realizado em uma ou mais consultas sem duração pré-determinada, objetivando receber qualquer pessoa no momento de sua necessidade para ajudá-la a compreender melhor sua emergência e, se necessário, encaminhá-la a outros serviços. Tanto o tempo da consulta, quanto os retornos dependem de decisões conjuntas (plantonista/cliente) no decorrer do atendimento.” (2001, p. 2)

É no plantão, onde temos o nosso primeiro contato com o cliente, e para isso, é necessário muito estudo, supervisão e psicoterapia. É essa tríade que vai nos dar condições pra o atendimento.
Inicialmente fui tomado pela ansiedade de chegar a clínica e atender logo, mas descobri que não funciona assim. Sempre tive comigo o pensamento de que psicologia –seja ela qual for a atuação- tem um papel importante e sua intervenção é como se fosse um instrumento utilizado por um neurocirurgião, onde deslizes podem afetar a vida do cliente em diversos níveis. Acho que nem preciso dizer, que o senso de responsabilidade aumenta bastante e que no meu caso, beneficamente me faz pesquisar mais e preencher algumas lacunas que ficaram abertas durante a minha formação. Ai, entra o papel importantíssimo da supervisão. Acho que minha supervisora tem sido essencial para a minha preparação. Nos estudos e reflexões sobre os textos e temas abordados durante os encontros.
Durante os momentos de estudo e supervisão, tem ficado muito claro pra mim, que a minha ansiedade é basicamente pelo fato de querer falar, de orientar, de resolver, em fim. Mas, ela tem abrandado bastante, principalmente quando eu aprendo que na relação com o cliente, eu preciso colocar as teorias, convicções e valores no bolso e suspender (redução fenomenológica), e apenas escutar. Escutar, o que difere do ouvir. Escutar é estar focado e ativo no conteúdo trazido pelo cliente. Existem relatos teóricos que evidenciam a mudança e o impacto positivo que o ato de escutar causa no outro. Confesso que isso é lindo, mas, é necessário muito trabalho pessoal para que a suspensão dos valores seja feita de forma correta e a escuta seja verdadeira. Daí, a importância da psicoterapia. Acho que está claro pra todos os estudantes e profissionais que a psicoterapia é fundamental em todo o processo – se você não está, que tal começar? -, pois ela te dá suporte para lidar com os conteúdos trazidos pelos clientes. Desde então, muita coisa tem mudado, dentre elas, o meu pensamento em relação ao cuidado do outro. É no plantão onde a visão unicamente ‘diagnóstica’ e ‘curativa’ é descontruída. Chegamos muitas vezes focados na patologia e na “cura”. E acredito que seja importante frizar, que não é papel do psicólogo curar. O psicólogo atua como facilitador da compreensão das queixas do cliente e é o cliente que vai orientar todo o processo.

 


















Bom, estou subindo os degraus e já, já estarei no atendimento do plantão. Confesso que dá uma friezinha no estômago pensar como será o primeiro atendimento, mas estou disponível e aberto para me aproximar do self do cliente e ajuda-lo na compreensão das suas queixas e demandas e contribuir para que ele encontre estratégias para o seu pleno desenvolvimento e progresso.

Em breve escreverei um pouco sobre as minhas impressões do primeiro atendimento e como tem se desenrolado os processos do plantão e supervisão. 

Referências
TASSINARI, Marcia Alves. Plantão Psicológico: atendendo no momento da necessidade. In VIII Colóquio de Sociologia Clínica e Psicossociologia. UFMG, 2001.
MORATO, HenrietteTognetti Penha(Org.). Serviço de Aconselhamento Psicológico do IPUSP: aprendizagem significativa em ação. In Aconselhamento Psicológico Centrado na Pessoa: novos desafios.São Paulo, Casa do Psicólogo, 1999, p.33-43.
MAHFOUD, Miguel. A Vivência de um desafio: plantão psicológico. In Rosenberg, R.L. (org.), Temas Básicos em Psicologia. São Paulo:E.P.U, pp.75-83, 1987.
LIMA, Elizandra Ferreira. Plantão Psicológico. Recife, UFPE, Trabalho de Monografia. Cap. 2.

domingo, 28 de junho de 2015

Casamento Gay - Dos EUA ao Brasil, Milhas de Celebrações


















Por Djair Junior



Eis que o azul do céu virtual amanheceu colorido. Não era o arco-íris resultante de gotículas de chuva e raios de sol, mas tratava-se de um arco-íris de celebração. O arco-íris não resultara das chuvas de Junho, mas de décadas de lutas e resistência de um povo que não quer nada além de direitos igualitários assegurados.
No dia 26 de Junho de 2015,  a Suprema Corte dos Estados Unidos da América (EUA) decidiu invalidar os vetos postos por alguns estados conservadores, legalizando assim, o casamento igualitário em todo o seu território. Esta medida tem grande importância, pois a ‘’autonomia’’ dos Estados americanos aliados ao conservadorismo, por muitos anos serviu como justificativa para que 14 dos 50 Estados não validassem este direito. (em 2004 o Estado de Massachusetts se tornou o primeiro do país a legalizar o casamento homossexual).
Aqui no Brasil desde 2011- através do reconhecimento do direito a União Estável para todos - os casais homossexuais puderam, por lei, usufruir dos mesmos direitos de um casal heterossexual. Apesar de se tratar de um conquista importante, este primeiro passo não foi o suficiente para garantir tal direito. Até o ano de 2013 foram documentados casos de juizes que se negavam a realizar estas uniões.
Como resposta a esta resistência, no dia 14 de maio de 2013, foi aprovada uma resolução que obriga todos os cartórios em território nacional a celebrar o casamento civil entre homossexuais, bem como realizar as conversões da união estável em casamento civil em todos os estados. Sim, caro leitor, o Brasil foi o 15° país no mundo e o 4°país americano a  reconhecer legalmente os direitos civis dos homossexuais.
Por  estratégia de marketing ou não, a tela da rede social mais utilizada pelos brasileiros - Facebook -  ofereceu a possibilidade de estampar nas fotos dos perfis dos usuários uma transparência com a bandeira do movimento LGBTT. O mesmo Brasil, que na rede social celebrou a conquista americana, ainda mostra-se resistente e ignorante ao asseguramento de alguns direitos humanos aos LGBTT’s.Listarei brevemente, algumas incoerências entre o que é garantido legalmente e o que é realizado na prática.
No site da Câmara dos Deputados, está sendo votada a aceitação ou negação da sociedade brasileira ao conceito de núcleo família presente no P.L do Estatuto da família. Com a pergunta: Você concorda com a definição de família como núcleo formado a partir da união entre homem e mulher, previsto no projeto de lei que cria o Estatuto da Família? Presenciamos de maneira explicita uma tentativa de retrocesso a uma não admissão de que existem uniões que não se enquadrem em um padrão heteronormativo. Ainda mais assustador é saber que até o momento em que escrevo este texto 4.383.021 pessoas, são coniventes com esse conceito reducionista.(Acessado em <http://www2.camara.leg.br/enquetes/resultadoEnquete/enquete/101CE64E-8EC3-436C-BB4A-457EBC94DF4E> em 29/06/2015).
Permitimos a união entre as pessoas do mesmo sexo, mas não ousem gritar um: ‘’Pode beijar o noivo!’’, pois somos líderes mundiais em crimes homofóbicos. No ano de 2014, foram registradas pelo Grupo Gay da Bahia 326 casos letais de homofobia. O conservadorismo e fundamentalismo arraigado em nosso pais e reforçado pela presença de um grande número de religiosos nos mais diversos casos políticos, não permite que avancemos para um modelo de sociedade de fato igualitária, onde todos tenham direito de ir e vir, de amar sem ser crucificado, de constituir famílias aos seus modos e de ter segurança e direito a vida.(  Acessado em : https://homofobiamata.wordpress.com/ em 29/06/2015).
Devemos celebrar o direito ao casamento gay nos Estados Unidos, como quem celebra uma conquista para o mundo. A lei garantirá que mais uma parcela da população mundial tenha direitos iguais no que se refere ao casamento e isso não se reduz a terras americanas, pois conquistas humanas são conquistas do mundo.  Que o Brasil e os Estados Unidos se aprimorem em garantias de direitos iguais e que sirvam de exemplo para outras nações. Que possamos somar as milhas de distâncias entre os Estados ás suas conquistas e convertamos em celebração ao amor. Só assim, veremos nos céus - virtuais ou reais - novos arco-íris, reflexos de tantas lutas.


segunda-feira, 1 de junho de 2015

ALGUMAS NOTAS SOBRE O FUTURO DO PRETÉRITO


















1. Futuro do Pretérito, tempo verbal que enuncia um fato que poderia ter ocorrido posteriormente a um determinado fato passado.
Freud nos diz que as histéricas sofrem de reminiscências. Talvez todos nós soframos de reminiscências. No relicário de nossa memória, de nossas lembranças, encontram-se representações periféricas que não possuem nome. São “aquilo” que nos acusa do que poderíamos ter sido e não se fez em nós. Um “a posteriori” sempre marcando presença na ausência do que não podemos ser, uma sombra de nós mesmos, o negativo de nossas possibilidades – sempre infinitas, sempre infinitas. O lastro de nosso umbigo.

2. Diz de um futuro em relação a outro, já ocorrido.
No filme “The Butterfly Effect”, de Eric Bress e J. Mackye Gruber (2004), Evan Treborn, um estudante universitário de vinte anos de idade, sofre os efeitos de um sistema dinâmico de dependência estreita entre as condições finais de sua história, em relação às iniciais.
H. G. Wells, já apresentara conteúdo ficcional semelhante em “The Time Machine” (1895), onde um cientista tenta consertar o passado, indo e vindo pelo tempo.
Interessante que em cada tentativa de modificação do que já foi, os personagens padecem de uma turbulenta experiência de transformação caótica daquilo que ainda será.
Interessante... No caso de “The Butterfly Effect”, os diretores nos oferecem alguns finais alternativos para o filme.

3. Hipótese, incerteza, irrealidade, o condicional do que não foi.
O que serei eu lá onde não se fez ainda, lá onde não me fiz ainda eu, olhando-me para o ontem do que fui e que creio ter-me predestinado a ser o que sou e o que serei? A isto posso chamar de Destino. Será possível vencer o Destino? Algumas pessoas parecem vencê-lo... Destino?
Serei eu fruto de combinações, de predisposições, de ambientes, de estruturas biológicas, de condenações metafísicas? Ou apenas serei?

4. Tempo verbal das possibilidades – se tratando de pensamentos, tudo é possível, “seria possível”.
O verbo “conjecturar” é deveras importante para a Psicanálise. Instrumento poderoso, desde que não confundido com devaneios estapafúrdios que conduzem-nos a abstrações sem sentido.
Em seu “Delírios e Sonhos na ‘Gradiva’ de Jensen” (1907), Freud permite-se conjecturar. O jovem Norbert, fascinado pelo relevo em mármore de sua Gradiva, (re)encontra a morta-viva nas ruínas de Pompéia. A fascinação se dá pelo efeito de ser o objeto de seu desejo – sua Gradiva em sua Pompéia -, nada mais do que Zoe, a amiga de infância, uma infância perdida no ontem, que direciona o agora, e traz o desfecho do amanhã. Zoe, por seu lado, aceita o destino de morta-viva imposto pela desatenção de seu pai e identificado no não correspondido amor de seu colega de infância. Ao final da obra de Wilhelm Jensen, de 1903, o amor, tratado por Freud como forma de cura, vence o delírio do jovem Norbert: o Desejo sobre o Destino.
Para além de uma aula de Psicanálise, um Freud genial entregando-se a uma grande conjectura sobre a infância remota e um futuro que, neste caso, acaba em “Happy End”.

5. Futuro do Pretérito, tempo da lógica do inconsciente. O Inconsciente, de certa maneira, é Futuro do Pretérito – inconscientes de tantas relações infinitamente possíveis.
O sujeito humano é sujeito inserido no cotidiano (ou quotidiano, de “status quo” – função de localização espacial). O cotidiano dos homens, correria à parte, é constituído de diálogos, conversas. As conversas entre pessoas são regidas por um tema assentado sobre uma lógica, normalmente oculta. Conversa-se, mas conversa-se sobre o que? Sobre várias coisas ao mesmo tempo – camadas de temas sobrepostos a outros temas. Ao núcleo oculto de um tema, encontramos regras próprias que o sustentam, regras estas também ocultas, inconscientes.
Atualmente, através do desenvolvimento das ideias psicanalíticas que, aliás, estão sempre a se desenvolver, percebemos a importância de relativizar o Inconsciente freudiano não mais como um “topos”, um lugar, mas sim como o próprio sistema de regras que regem o cotidiano, ou cotidianos dos homens. Não temos, então, o Inconsciente, mas sim inconscientes relativos aos diversos e possíveis campos de discurso.
Conversamos sempre sobre um “agora”, localizado entre um pretérito experimentado neste momento e um futuro desejante e projetado também neste momento.
Sou Eu agora, entre o que fui e o que serei.

MARCOS INHAUSER SORIANO é psicanalista, editor da Revista Vórtice de Psicanálise.

quinta-feira, 26 de março de 2015

A SÍNDROME DE DOWN


Recentemente a prática médica tem incorporado métodos para a determinação do risco de ter um filho com SD, como por exemplo, o exame bioquímico, que se realiza mediante a avaliação dos níveis de substâncias químicas no sangue materno alteradas no caso da SD. Este exame se realiza entre a semana 14 e 17. A ultrassonografia também pode colaborar para detectar a SD, através dos marcadores ecográficos, principalmente da prega nucal, que pode ser medida a partir da décima semana de gestação. Estas últimas intervenções não são consideradas diagnósticas, para isso é necessário realizar os exames mencionados em primeiro lugar.

A síndrome de Down (SD) é uma alteração genética produzida pela presença de um cromossomo a mais, o par 21, por isso também conhecida comotrissomia 21.
A SD foi descrita em 1866 por John Langdon Down. Esta alteração genética afeta o desenvolvimento do individuo, determinando algumas características físicas e cognitivas. A maioria das pessoas com SD apresenta a denominada trissomia 21 simples, isto significa que um cromossomo extra está presente em todas as células do organismo, devido a um erro na separação dos cromossomos 21 em uma das células dos pais. Este fenômeno é conhecido como disfunção cromossômica. Existem outras formas de SD como, por exemplo: mosaico, quando a trissomia está presente somente em algumas células, e por translocação, quando o cromossomo 21 está unido a outro cromossomo.
O diagnóstico da SD se realiza mediante o estudo cromossômico (cariótipo), através do qual se detecta a presença de um cromossomo 21 a mais. Este tipo de análise foi utilizado pela primeira vez em 1958 por Jerome Lejeune.
Não se conhece com precisão os mecanismos da disfunção que causa a SD, mas está demonstrado cientificamente que acontece igualmente em qualquer raça, sem nenhuma relação com o nível cultural, social, ambiental, econômico, etc. Há uma maior probabilidade da presença de SD em relação à idade materna, e isto é mais freqüente a partir dos 35 anos, quando os riscos de se gestar um bebê com SD aumenta de forma progressiva. Paradoxalmente, o nascimento de crianças com SD é mais freqüente entre mulheres com menos de 35 anos, isto se deve ao fato de que mulheres mais jovens geram mais filhos e também pela influência do diagnóstico pré natal,que é oferecido sistematicamente  às mulheres com mais de 35 anos.
Como a SD é uma alteração cromossômica, é possível realizar um diagnóstico pré natal utilizando diversos exames clínicos como, por exemplo, a amniocentese (pulsão transabdominal do liquido amniótico entre as semanas 14 e 18 de gestação) ou a biópsia do vilo corial (coleta de um fragmento da placenta). Ambos os exames diagnosticam a SD e outras cromossopatias.
Embora as alterações cromossômicas da SD sejam comuns a todas as pessoas, nem todas apresentam as mesmas características, nem os mesmos traços físicos, tampouco as malformações. A única característica comum a todas as pessoas é o déficit intelectual. Não existem graus de SD; a variação das características e personalidades entre uma pessoa e outra é a mesma que existe entre as pessoas que não tem SD.
Cerca de 50% das crianças com SD apresentam problemas cardíacos, algumas vezes graves, necessitando de cirurgia nos primeiros anos de vida.
A intervenção médica pode acontecer com a finalidade principal de prevenção dos problemas de saúde que podem aparecer com maior freqüência na SD. Queremos destacar que a SD não é uma doença e sim uma alteração genética, que pode gerar problemas médicos associados.
Devemos olhar a pessoas com SD em sua singularidade, para que possa ter um pleno desenvolvimento enquanto sujeito.
Por Érica Silva

ercsilvapsico@bol.com.br

segunda-feira, 16 de março de 2015

A CONSCIÊNCIA DE UMA FUTURA PSICOTERAPEUTA


“Por outro lado, se renunciarmos ao nosso senso de segurança, e admitirmos ao nosso senso de segurança, e admitirmos que este ser diante de nós é tão complexo, único e misterioso como nós somos; é uma pessoa, e que essa pessoa existe dentro de um contexto, então toda a natureza do encontro muda.”

O texto: A Consciência do Terapeuta nos faz refletir sobre a importância de sermos nós mesmos durante todo o processo junto ao nosso cliente. Enquanto Psicoterapeutas e/ou futuros Psicólogos, temos que estar conscientes que nossas ações emergem de acordo com a direção que a relação Psicólogo x Cliente irá tomando. O Psicólogo não é o “expert” da situação, até porque, cada cliente traz consigo o seu mundo, portanto cada relação se transforma em um novo encontro. Durante o curso sempre escutei que o cliente que está nos livros, não é o cliente que vamos nos deparar a nossa frente, e isto é fato. É necessário estarmos livres e não acorrentados a pré-julgamentos, porém se faz necessário uma boa preparação e assim poder estar inteiro durante o encontro com alguém que você nem ao menos sonha que existe, mas ele existe e estará a sua frente despindo-se e dizendo que precisa de ajuda.


Rogers nos diz: “Sinto-me mais feliz simplesmente por ser eu mesmo e deixar os outros serem eles mesmos.” De acordo com esta afirmativa podemos entender o quanto é necessário para um terapeuta e/ou futuro da Abordagem Centrada na Pessoa ser ele mesmo e deixar-se encontrar, e assim cliente x terapeuta tornam-se pessoa numa relação única e singular, porém devemos nos lembrar que não sabemos quase nada sobre a natureza de um ser humano vivo, como afirma Maureen Miller no texto. A consciência do terapeuta deve ser ampla diante das diversidades trazida pelo seu cliente, pois nem tudo parte do psicológico, portanto devemos nos apropriar da situação que emerge. Concordo com a seguinte afirmação: “Com todos os milhares de volumes escritos e publicados sobre o tema da condição humana, podemos, se desejarmos, dar-nos a confortante ilusão de que entendemos nossa natureza.” Quando paramos e refletimos sobre essa consciência do terapeuta e entendemos que não somos os donos da verdade, percebemos que nós também criamos possibilidades de crescimento junto ao nosso cliente, portanto esta consciência deve ser livre e espontânea já que este encontro torna-se singular e acontece de pessoa para pessoa.


O ser humano não é uma máquina, nós não somos máquinas, o trabalho do terapeuta não acontece como apenas um copiar e colar, o trabalho do terapeuta transcende seu corpo, sua escuta, seu olhar em todos os sentidos. Segundo Heidegger: “A condição terrena do homem atual está ameaçada em seu âmago. Mais ainda: a perda da condição terrena não é causada apenas pelas circunstancias externas e fatídicas, nem tampouco consiste apenas na negligência e superficialidade do modo de vida dos homens. A perda da condição terrena provém do espírito da ética em que nascemos. (...) O propriamente assustador não é o fato de que o mundo se torne cada vez mais técnico. Muito mais assustador é o fato de que o homem não esteja preparado para esta modificação do mundo, que nós não tenhamos condições de, numa confrontação adequada, meditar ponderadamente sobre aquilo que ocorre, sobre aquilo que propriamente acontece nessa época.” O terapeuta deve sentir-se confortável e assim poder entrar poder entrar no mundo do seu cliente, livre de quaisquer prejulgamentos partindo ta aceitação incondicional. 
Érica Silva

ercsilvapsico@bol.com.br

sexta-feira, 6 de março de 2015

IMPLICAÇÕES DA PERÍCIA PSICOLÓGICA PARA O PSICÓLOGO JURÍDICO














Por Gabriel Mendes


O Psicologo jurídico encontra-se implicada em um jogo triangular de produção de verdade e de razão, no qual pessoas em litígio se colocam à disposição da decisão de uma terceira instância, o Poder Judiciário. Ocupa, assim, um lugar estratégico no jogo de sedução do poder e da Justiça, pois é supostamente capaz de produzir a verdade que irá, finalmente, dissipar todas as dúvidas e justificar a decisão que será tomada.
Nesse nível é que se forma a sensibilidade – certos modos de olhar e de escutar – na relação com as pessoas entrevistadas; as quais, por sua vez, trazem consigo suas próprias expectativas e suas demandas relativas.
Embora toda a entrevista psicológica exija certos cuidados técnicos e éticos em relação ao modo pelo qual o entrevistador conduz a si mesmo na relação que estabelece com o entrevistado, não se trata aqui de uma relação terapeuta-paciente. O enquadre ganha limites bem diferentes daqueles do consultório e, mesmo que o falar na primeira pessoa do singular, diante de um outro que escuta, provoque potenciais efeitos subjetivos aos quais deve-se estar atento, a entrevista deve ser sempre, no contexto da perícia, destinada a produzir o laudo ou a prova, atravessada pelo conflito judicial.
Dizer isso, porém, não significa acomodar-se a simplesmente escutar as partes e executar aquilo que é determinado, sem qualquer crítica. É possível, ao longo das entrevistas, trabalhar as fantasias e as expectativas relativas aos lugares atribuídos pelas partes, graças à atualização, pela via da transferência, das histórias singulares e das relações que precederam a abertura do processo, o que fica claro no transcorrer das entrevistas, através das mudanças de posicionamento e atitudes das partes ao ser entrevistado. Essas falas, construídas a partir de histórias singulares, envolvem afetos, fantasias e expectativas que, ainda que atreladas ao processo, escapam ao alcance do saber judicial. Uma intervenção que leve em conta o elemento transferencial pode contribuir para que se produza, nas, e pelas partes envolvidas, uma ressignificação dos conflitos e da própria demanda judicial.

Ao assumir, portanto, ser o portador de certa verdade, o psicólogo, como perito, deve avaliar todas as possíveis implicações e efeitos que sua produção pode produzir no campo intersubjetivo que o processo configura, para que o psicólogo possam construir, com ética, caminhos e práticas profissionais.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

O TABULEIRO E O SHOPPING CENTER: ONDE TRABALHAM OS NEGROS?





















Por Walmilson Barros


Voltando de mais um dia de trabalho me deparo com a história frente a frente, depois de um longo dia de aula que, como sempre, tenho que me transformar em mil passando de um mundo antigo a uma pós modernidade no mesmo dia e falando para cabeças com formações diferenciadas, eis que me confronto com meus conhecimentos.
Pego o bom e velho busão e vejo um senhor fustigado, exaurido depois de mais um dia de trabalho. Sua função? Vendedor de cocada. Uma forma de ganho de vida tão comum no período colonial que permanece até os dias atuais como um mecanismo de sobrevivência. Deparando com aquela imagem do velho senhor hiper cansado um monte de imagens sobrevieram e não tinha como não fazer a correlação com  a aula horas mais cedo, falamos sobre os povos escravizados e como era sua forma de trabalho, suas formas de resistências, e como até os dias atuais os trabalhos mais subalternos estão praticamente presos aos negros (pardos+pretos), isso denota o quanto ainda temos no Brasil em rever conceitos, formas de organização social que interferem na dignidade humana, não que um trabalho de vendedor de cocadas não seja digno, não é isso, mas a população negra merece chegar nessa idade (o senhor aparentava ter um setenta anos) com condições de aproveitar a vida, descansar depois de ter contribuído dentro de suas condições.

O tabuleiro me chamou atenção por que ele sempre esteve associado ao papel feminino na colônia com a quitandeiras, as baianas, hoje em pleno século XXI temos muitos desses vendedores que representam um resquício do período onde fica quase restrito ao trabalho realizado pela população negra. Outra observação gritante nesse processo trabalho/negros é a sua inserção no mercado, ainda é irrisória a participação deles em vários setores, é muito fácil fazer tal observação, basta olharmos os trabalhadores de shopping center, onde estão os negros? Lá também não são vendedores? Ao que observamos, não! Estão em grande maioria reservados ao trabalho braçal em copas e serviços de limpeza, quando não e estão em atendimento são como figuras estigmatizadas para “chamar” atenção”, como figuras “exóticas”. Do tabuleiro colonial ao shopping center moderno continua a velha e triste da segregação étnica Brasil, seja na rua ou em centros de compras fechados estão lá os negros prestando seus serviços.

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

ENSAIO: O ENGODO E O TEMPO


 




















Por: Marcos InHauser Soriano



Em suas implicações, a deformação de um texto assemelha-se a um assassinato: a dificuldade não está em perpetrar o ato, mas em livrar-se de seus traços.” (SIGMUND FREUD, 1939)


Em seu “Der Mann Moses Und Die Monotheistische Religion: Drei Abhandlungen”, publicado em 1939, Freud tece críticas sobre a reconstrução, às vezes no intuito de falsificar “objetivos secretos”, de uma história primitiva, utilizando-se dos primórdios do povo de Israel. Com a interpolação ficcional de “se Moisés fosse egípcio”, Freud faz saltar da história contada, perdida no tempo, um duplo Moisés, condensado no herói hebreu, e um duplo Javé, condensado no Deus da aliança monoteísta. Tudo no texto histórico passa a ter duplos: personagens, deuses, lugares sagrados, e intenções. O próprio texto freudiano, que começa a ser redigido em 1934, sofre da armadilha, às vezes em prol de melhoras, às vezes em prol de adequações.

O mundo mental humano funciona de igual maneira. De sua história primitiva o homem nada sabe; os primórdios de sua história pessoal são uma reconstrução, às vezes criação de memórias, que preenche vazios, desfaz lacunas, reinventa um bebê que, em verdade, é projeção do olhar adulto. A memória nasce na passagem da criatura biológica à criatura humana. “Objetivos secretos” são expulsos do pensamento tido “normal”.

Nossas instituições funcionam de igual maneira. Do texto original, que se perde ao longo do tempo, pouco sobra de originalidade. As instituições humanas também falsificam sua história, às vezes em prol de melhoras, às vezes em prol de adequações que escondem “objetivos secretos” - propositalmente.

O povo não tem memória” é uma ideia bastante difundida por aqui, em nossa saudosa Terra Brasilis. Interessante conjugar a ideia com o fato de que, levando-se em consideração propostas de todos os tipos, geralmente a escrita torna-se incompreensível, repleta de dados estatísticos e siglas que pouco dizem ou esclarecem sobre o assunto discutido. Com o tempo, a própria fala se perde completamente, recriada por uma virtualidade midiática que, praticamente, reinventa novamente nova história. E assim vamos em frente: “Quem conta um conto, aumenta SEU ponto”.
Interessante também, conjugar a ideia com outro exemplo. Poucas pessoas se debruçam, ou mesmo têm conhecimento, de que as Sagradas Escrituras, compiladas na Bíblia, intencionam ser a transmissão da palavra de Deus. Mas qual Deus? Quando levamos em conta a questão histórica, política, religiosa e, principalmente, toda a problemática envolvida na tradução ocidental que temos do texto bíblico, ficamos com o mesmo desconforto: “Quem conta um conto, aumenta SEU ponto”. A “Palavra” diz o que a escrita deformou – como aponta Freud, em 1939.
Neste sentido – e não é ao acaso que utilizo como metáfora o texto bíblico -, nem a escrita de Freud escapa do engodo. Não só encontramos a problemática, aparentemente resolvida, de anos de Standard Edition (tradução para o a língua portuguesa, não do alemão original, mas do inglês de Anna Freud), como também passamos pelo uso e compreensão diversos, que contemplam os templos da guerrilha escolástica que predominou nas instituições psicanalíticas – uma verdadeira “Torre de Babel” (se é que a história tem alguma procedência, que fique claro). Normalmente, ao discutir conceitos e a própria clínica, tratando da importante questão do que faz a Psicanálise e do por que funciona, caímos no velho ditado: “Quem conta um conto, aumenta SEU ponto”.

A citação freudiana de 1939, bem poderia ter sido de Dostoiévski, na boca de sua criação, o jovem estudante russo Raskólnikov, ao final de “Crime e Castigo”. Destino humano? Ou talvez a crítica ética do próprio Raskólnikov esteja démodé, soterrada por uma lógica perversa do mundo contemporâneo?
Onde está a verdade histórica? Ninguém sabe, ninguém viu...


Este Ensaio é uma extensão do texto publicado em 14/set/2014 em UM TRANSEUNTE – http://umtranseunte.blogspot.com.br -, muito em função do cenário político do país do qual sou filho e tento ser cidadão.

quinta-feira, 10 de julho de 2014

SOBRE A COPA, A SELEÇÃO BRASILEIRA E O BRASIL...




Por Luan Lins

Vamos direto ao assunto...

Acho coisa de babaca atrelar o mérito de um país a uma seleção de futebol... É realmente "complexo de vira-lata" de quem tem apenas o resultado de um jogo pra se orgulhar ou não de um país... Taí algo a ser pensado: o único valor do Brasil é o futebol? Aparentemente, pra uma expressiva parte do país, a coisa é por este caminho mesmo...


Desde que a Seleção foi eliminada da copa, observa-se uma onda de depressão nacional  e desgosto por parte de uma maciça parte do país. A falta de técnica, tática e garra dos jogadores já foi atrelada a presidenta Dilma, que cá pra nós, acho que a única coisa que entende de futebol é quando se faz um gol... rs rs rs Da coitada da psicóloga que não teve a capacidade de preparar os jogadores emocionalmente para o jogo; Do Conselho de Psicologia por não preparar técnicas pro Brasil ser campeão na final... E os "bois de piranha" não param por ai...

Esse complexo de inferioridade, ou melhor, de "vira-lata" que circula em muitos indivíduos e que é reforçado pelos veículos de comunicação que estão a serviço de emitir uma imagem superficial  e monstruosa da nação, não seria tão grande e expressivo se tivéssemos conhecimento transcendente das reais potências do Brasil e de suas qualidades... O Brasileiro tem uma baixa-estima patológica... Não reconhece seu valor, não reconhece sua capacidade, tem vergonha de si e por não conseguir se enxergar, projeta as suas esperanças de vida, sucesso e felicidade num jogo que tem por função alienar e garantir o pão e circo diários... 


Não menosprezo o futebol e não acho se deveria, pois ele também faz parte da nossa identidade brasileira. O nosso país tem e teve craques que fizeram e fazem história por suas jogadas e suas conquistas. O que não compreendendo é resumir toda uma cultura, uma história, uma evolução a uma atividade recreativa de correr atrás de uma bola e acertá-la numa rede... Precisamos rever nossos valores e encarar o que realmente precisa da nossa atenção e preocupação, deixando de lado interesses superficiais. 

Pra mim está claro que o Brasil não precisa de jogadores, o Brasil não precisa de bolas, estádios e muito menos de uma depressão coletiva. Do que o Brasil precisa pra ontem, são pessoas, pessoas que o conheçam, que o reconheçam, que se reconheçam, que lute por ele, que dê o seu melhor, que faça uma boa e limpa política com transparência, sem corrupção (do pipoqueiro ao deputado), que melhore hospitais e escolas, que leve qualidade de vida a todos, que acabe com a miséria, que gere emprego e renda com bons salários... E que tenha coragem de olhar pra si e reconhecer seu valor... E isso só vai acontecer quando abrirmos de verdade os nossos olhos, olharmos pras sarjetas, pros interiores, favelas, cidades e sertões do país e vermos que a fome, a falta de moraria, água, saúde limitada, a ignorância, e o analfabetismo são as nossas principais chagas. Só assim, uma tristeza, uma amargura e uma depressão coletiva terão sentido e só assim vamos parar de projetar os nossos defeitos nos outros... Fora isso, é desperdício... 

Brasileiros, vão pra terapia!

domingo, 25 de maio de 2014

CRÔNICA DE UM SACRAMENTO




















Por Marcos InHauser 


Vão vivendo assim, juntos, entre bofetões, mútuas humilhações, chutes e xingamentos, tudo temperado por noites de transa quente – o amor limita-se ao quarto.
Ele, esfuziante, faz o tipo “tutti buona gente”, amigo pronto para qualquer parada. Padece, entretanto, de uma maldição de que “tem de ser bonzinho”, numa crença em busca de seu Paraíso particular. Certa humildade germinou-se dentro dele, provavelmente enraizada na relação com a mãe “tutti buona gente”. A humildade o empurra para trás e para baixo – uma sola furada no sapato, seu troféu. Justifica-se exageradamente.
Ela, ditadura encarnada, acredita piamente possuir “o Pênis”. Mas não o possui... Projetou um mundo de soberba, chiquérrimo, “Very Important Person”. Fechada em tono de si mesma, em sua mesquinhez, é odiada pelas costas, um vazio relacional completo, provavelmente ligado ao Pai que não houve. Justifica-se empobrecidamente.
Casal mais que perfeito, quando visto pelo ângulo masoquista. E assim vão vivendo, aos berros, aos apelos nunca satisfeitos de completude, que existe apenas dentro do quarto.
Não há segredos lá, na individualidade que necessita ser preservada. Um estranho escancaramento de intimidade, ao extremo – experiência que não é pra qualquer um, somente para os fortes de alma.
Tiveram, juntos, criancinhas... Ele, para poder se projetar o pai/mãe perfeito. Ela, não se sabe ao certo.

Na Conferência XXXII das “Novas Conferências Introdutórias sobre Psicanálise”, de 1933, Freud, ao tratar da ansiedade e da vida instintual, apresenta resumidamente questões bastante relevantes sobre a relação entre o masoquismo, a necessidade instintual de punição e o supereu. Freud não deixa dúvidas quanto à cobrança punitiva do supereu, que germinando no inconsciente, vai assombrar o sujeito neurótico avassaladoramente, na direção de uma reparação sempre impossível.

Ele, satisfeitíssimo com a projeção de “um pobre coitado”, vai desenvolvendo uma hipocondria punitiva. A qualquer sinal de avanço em um ser maduro, sente a morte espreitar, observando-o à distância, esperando um momento de deslize... “Tutti buona gente”.
Ela, apaixonada eternamente pelo Pai que ama esbofeteando, cria uma soberba que, crescendo como tumor, vai isolando, diminuindo, aniquilando por completo a possibilidade de ser amada, posto não saber amar.

Freud já dizia que as coisas do Amor são melhor exploradas pelo poeta do que pelo analista. Cita-se, então, como preciso projeto de vida, Chico Buarque (1977/1978), ao final de “O Casamento dos Pequenos Burgueses”:

Ela esquenta a papa do neto
E ele quase que fez fortuna
Vão viver sob o mesmo teto
Até que a morte os una
Até que a morte os una


MARCOS INHAUSER SORIANO é psicanalista.